São mulheres, mas podem ser homens também. São novas, mas podem também já ter idade avançada. Têm baixos estudos, mas são doutoradas também! São pobres, mas são ricas também! São médicas, advogadas, empregadas de limpeza, desempregadas, qualquer profissão, ou falta dela, pode contar para este texto!

São mulheres, neste caso,… é uma mulher!

Tem 25 anos e um filho de um homem por quem se apaixonou.

E só o desespero, de quem considera já ter “esgotado” todas as hipóteses, levou esta jovem a procurar o “nosso” jornal para contar a sua história de vida….

Um quarto de século de vida e uma história de violência para contar…

 

Uma jovem que durante todo o tempo em que falou connosco mostrou a segurança de quem fala por “muitas” e não apenas pelo seu caso!

Aguardamos, aliás, por estatísticas oficiais para podermos mostrar aos nossos leitores dados da região ao nível da violência doméstica, motivações dos agressores (ou agressoras) e quais os meios de ajuda disponíveis nestas alturas…

 

Mas voltemos à “nossa” mulher, uma jovem, recorde-se, de 25 anos…. que se apaixonou aos 21 e, como muitas histórias de amor, começam com um namoro até à partilha de uma casa.

“Passámos bons momentos”, confessa-nos, mas recordando, no imediato, “a primeira agressão, onde houve estalos, um apertar de pescoço, um empurrão contra a parede e arremesso de objetos por onde fosse”. “Uma das vezes estava grávida de três meses…. Pontapeou-me, mas eu consegui fugir até à casa de banho. Só sai quando ele saiu porta fora… Ele chegou, passadas umas horas, e foi como se nada tivesse acontecido…”, conta-nos.

“E também não lhe dizia nada?”, perguntamos.

“Não queria puxar o assunto. Tinha medo da reação….”, responde.

 

Era agressor uns instantes, mas também atencioso outros tantos. “Acompanhou sempre a gravidez”, conta-nos esta jovem, que depois de ser mãe, viveu o igual cansaço que todos os casais passam. “Gritávamos muitas vezes durante as discussões, mas eu acho que todos os casais passam por isto!”.

“Três meses antes do meu filho completar um ano, estava com ele ao colo, para sair de casa, e começámos a discutir… Deu-me três murros na cabeça e senti-me a perder as forças nas pernas. Aguentei-me e consegui sair de casa, com o meu filho sempre a chorar!”

 

“Mas pior foi passados dois dias. Estava na casa de banho a arranjar-me e, sinceramente, não consigo se quer relembrar-me do que se passou, porque até acho que na realidade não aconteceu mesmo nada, e ele entrou na divisão e deu-me um estalo!”.

Foi em abril de 2017…. “Altura em que apresentei a primeira queixa…”.

“Como a casa é minha, ele nesse dia saiu… mas dormiu à porta, dentro do carro. Bateu-me em casa a dizer que tinha frio e acabei por lhe dar um cobertor…”

E voltou a bater, segundo esta jovem,…. para lhe pedir desculpa!

“E o que fez?”, perguntei.

“Fui à GNR, no dia seguinte, dizer que fui incomodada toda a noite!”

 

Mas depois de alguns tempos separados, “voltaram”. Voltaram a viver na mesma casa… “Foi a pensar no meu filho… Para além disso, ele (agressor) procurou ajuda médica e estava a ser encaminhado para um psicólogo….”.

Mas nada era igual… “Ele era apenas o meu companheiro de casa. Nada mais!”, referiu, contando o episódio em que lhe disse que não queria mais ser sua namorada. “E ele aceitou! Estranhamente, aceitou!”.

 

Aceitou, até passados uns dias, “me pontapear a porta e arrancar a fechadura!”. “Nesse dia fiquei com um hematoma na cabeça e ainda me ‘entalou’ entre o carro dele e outro que estava estacionado”.

 

“Em meio ano acho que já apresentei umas seis queixas. Ainda há dois meses me cuspiu na cara e me deu um estalo”.

“Mas costumam estar juntos?”, perguntamos.

“Sim. Por causa do nosso filho…. Ele é cuidadoso com ele e cumpre com o dinheiro que lhe tem que dar!”.

 

Não são um casal, mas há um filho, que “obriga” a um relacionamento. “A porta ainda está arrombada (apesar da casa estar em segurança), para que possa ser uma prova mais concreta da violência e não apenas fotografias…”

“E as memórias?”

“Essas estão todas na cabeça….”, responde-nos.

“O que me assusta é não saber se o Ministério Público atua daqui a dois dias, dois meses, dois anos ou dez! E eu não sei se ele amanhã passa o dia sem me dizer nada ou se me envia trinta mensagens, me persegue de carro ou vai bater lá a casa”.

 

E esta é “a mensagem que ninguém quer receber…”, a mensagem que só respondemos passado muitas horas depois de a ler e em que apagamos o que escrevemos, muitas vezes, na hora de responder….

Não sabemos como reagir ao desespero, temos vontade de falar com o agressor (na ilusão de que seriamos nós a resolver o problema) e de beber café com a vítima, no dia seguinte, na tentativa de saber se está tudo bem….

 

Esta é a história de mulheres, e também de homens, por todo o mundo. Esta é a história desta mulher! Que há umas semanas nos procurou e cujos apontamentos ficaram fechados na expectativa de que assim era quase certo que desapareceriam….

Mas não desapareceram, nem desta, nem de nenhuma outra…. basta abrir jornais, ligar a televisão e pesquisar na internet….

E em respeito para com todas as vítimas de violência doméstica, partilhamos esta história, que muito nos custa, na esperança de que, o futuro, se torne num passado distante!

 

Texto de Mónica Sofia Lopes

Fotografia de Free-Photos (pixabay.com)