A Câmara da Mealhada lamentou, ontem, a proposta do conselho de administração da ERSUC – Resíduos Sólidos do Centro, S.A., em distribuir dividendos, no valor de um milhão e 700 mil euros por todos os associados, no qual está também o município mealhadense, uma vez que tem 8% de ações. O presidente da Autarquia critica que a empresa tenha onerado os seus clientes nos serviços de recolha e tratamento de resíduos, o que levou a que os Municípios aumentassem também os tarifários aos munícipes, e não aproveite agora estes valores para proceder a investimentos na ERSUC.
«Na última assembleia-geral, houve alguns dados que nos indignaram, a nós, Municípios, principalmente uma proposta do conselho de administração ligada à distribuição de dividendos por todos os associados», começou por dizer António Jorge Franco, presidente da Câmara da Mealhada, que referiu ainda que «foi apresentado um resultado líquido do exercício de 2023 em cerca de 148 mil euros. Achamos que este valor, de saldo positivo, deveria ir para uma reserva, mas para nossa surpresa só sete mil é que irão. O restante com acréscimo de valor – em cerca de um milhão e 700 mil euros – será para distribuição por todos os associados, uma decisão que todos os municípios votaram contra, excetuando a Empresa Geral do Fomento e a SUMA».
«Como todos sabem há um esforço enorme de toda a população com o aumento das tarifas para que nós, Câmara, paguemos o valor que a ERSUC cobra. Está a ser pedido um esforço a todos os munícipes, que pagam um valor brutal de taxas de tratamento, para vir o conselho de administração da ERSUC fazer distribuição de dividendos», lamentou o autarca, enfatizando que o pior é que «as Câmaras nada podem fazer para travar esta medida, cujos maiores dividendos serão para a SUMA e para o EGF, que têm a maioria. O lucro desta forma não é justo e assim não sei onde isto vai parar».
Rui Marqueiro, vereador eleito pelo Partido Socialista, afirmou que «o conselho de administração está a usar reservas livres», relembrando que também o Município da Mealhada, por ser associado, «vai encaixar cerca de 180 mil euros. Se acham que isto é uma gestão danosa, façam valer os vossos direitos». Declaração que levou António Jorge Franco a dizer que «arrecadamos 180 mil euros, mas há duas empresas que levam um milhão de euros e andamos nós a pedir um esforço aos munícipes. Esse valor dos dividendos devia ser para investir na empresa e para aliviar a carga dos munícipes».
Filomena Pinheiro, vice-presidente da Autarquia, lamentou: «Ao ponto que a ERSUC chegou, que é tudo menos uma empresa de gestão e valorização do tratamento de resíduos. Desviou-se do objetivo principal e só se pensa na questão financeira».
A discussão surgiu no ponto da ordem de trabalhos da designação do representante do Município da Mealhada na empresa para 2024-2026, um cargo até então assumido por José Calhoa, nomeação que vinha desde o mandato autárquico anterior e que, ontem, assumiu ter sido a favor da distribuição dos dividendos pelos associados. «Apresentamos Rui Simões para vogal no conselho de administração. É alguém que conhece os problemas da ERSUC e o que os municípios sentem e, por isso, esperamos que nos ajude», defendeu António Jorge Franco, corroborado pelo vereador Hugo Silva que desejou «bom trabalho ao novo vogal não executivo. Esperemos que agora sim o desempenho da empresa seja escrutinado».
A ratificação deste despacho obteve o voto contra de Rui Marqueiro e as abstenções de Sónia Leite e José Calhoa, todos eleitos pelo Partido Socialista.
Moção de protesto à ERSUC aprovada, em dezembro, em Assembleia Municipal
O descontentamento da Mealhada com a prestação da ERSUC não é novidade e, em dezembro passado, foi até aprovada, na Assembleia Municipal, por maioria, uma moção de protesto, «devido ao aumento de custos associados à recolha e tratamento de resíduos e ao facto da ERSUC avançar com a recolha porta-a-porta de recicláveis apenas em Coimbra e Aveiro, de forma gratuita». A moção apresentada pela bancada do Movimento Independente Mais e Melhor, foi, nessa altura, enviada à administração da empresa.
A moção refere que o tarifário cobrado aos municípios – e por consequência aos munícipes – «está a aumentar rapidamente» e «vai em breve cruzar a barreira dos 100 euros por tonelada». «Os munícipes da Mealhada estão a ser onerados, enquanto utentes do serviço, e não vislumbram qualquer benefício de investimento feito anteriormente (com a aquisição de ações)», lê-se num comunicado municipal.
A contestação da Assembleia da Mealhada refere-se também à decisão da ERSUC de avançar com a recolha de recicláveis, de forma gratuita, em Aveiro e em Coimbra, «um processo que, segundo a própria administração da ERSUC, tem um custo altíssimo e irrecuperável pela tarifa, representando uma despesa brutal para a empresa», refere o documento apresentado por André Melo, na sequência de uma reunião com a administração da ERSUC, que considera «inaceitável» que a empresa «faça estes investimentos que beneficiam apenas alguns e custam a todos. É incompreensível que se faça numa altura em que os custos da dívida sejam brutais nos resultados da empresa. É imoral que a sua administração não seja capaz de dar uma boa justificação a esta decisão».
Mónica Sofia Lopes