«Deixei lá tudo o que tinha, acho que até as sapatilhas, mas vim tão mais rico e crescido enquanto pessoa…». É assim que Miguel Midões, um dos voluntários da Associação Humanitária Gongô, descreve uma das suas missões em São Tomé e Príncipe. Foi precisamente aqui, ainda em solo africano, decorria o ano de 2019, que um grupo de amigos, maioritariamente residentes no concelho da Mealhada, germinaram a ideia para criação de uma associação, apresentada na passada sexta-feira, que tem como primeiro objetivo a reabilitação de uma escola primária em Águas Belas, perto de Bombaim, localizada no interior da ilha e totalmente fora do roteiro turístico.

Enquanto apresentava a associação que preside, Paula Gradim relembrava os cheiros, as paisagens, a beleza natural e o modo «leve leve» com que se vive em São Tomé. Mas é precisamente ali, concretamente numa escola primária em Águas Belas, que, enfatiza a dirigente, escasseia tudo: «Luz, higiene, água potável, material escolar, ou seja, faltam condições dignas para que as crianças possam simplesmente sentir-se bem e seguras e tenham condições para aprender e ganhar as suas ferramentas pessoais para vida».

«Ouvimos que eramos uns privilegiados por termos nascido no lado certo do mundo. Mas do que vale esse privilégio, se não for partilhado?», continuou a presidente da direção da Associação Gongô (que no dialeto santomense significa «amar»), desvendando que «através de um contacto com uma professora que está lá, em 2020 fomos ver a escola e levar material escolar. Voltámos com a certeza de que tínhamos de levar amor ao mundo».

E foi assim que nasceu a Gongô, em julho de 2022. «O nosso objetivo é dar dignidade às pessoas, concretamente às crianças. Focamos a nossa ação em terras africanas, mas queremos também ajudar aqui, no nosso país», enfatizou Paula Gradim, explicando em concreto as necessidades da escola de Águas Belas, enquanto num ecrã se viam imagens disso mesmo. «Tem apenas uma sala; o teto está degradado; tem uma cozinha precária e o refeitório sem espaço; a escola não possui cerca e, por isso, os animais entram e deixam excrementos; o professor, muitas vezes por falta de meios que o permitam, não consegue regressar a casa e tem que dormir na escola, num quarto sem condições e onde aparecem muitas vezes ratos», enumerou, garantindo que vão entrar na fase de obra, através de parceiros em  São Tomé, propondo-se a associação «a arranjar o telhado, a casa de banho, a cerca, o refeitório e a fazer pintura, assim como instalar candeeiros solares».

«Isto, acreditem, é uma gota no oceano. Quando vamos lá e voltamos, parece que sentimos que não fizemos nada, dadas as necessidades que existem. Mas acreditamos que com cada diferença pequenina, conseguiremos melhorar o mundo», enalteceu. Palavras corroboradas por Miguel Midões, presidente da mesa da assembleia-geral da associação, que confessou ter «deixado tudo o que levou» em São Tomé, «acho que até as sapatilhas», disse, afirmando ainda: «Quando cheguei, durante um mês andei a refilar com tudo e com todos porque realmente perdemos tempo com coisas tão desnecessárias. Nós vamos lá dar tudo, mas chegamos muito mais ricos e crescidos enquanto pessoas».

«Temos a sorte de ter no nosso concelho estes cidadãos de primeira que fazem da Mealhada um município diferente. Perdemo-nos muitas vezes em reivindicações pequeninas, esquecendo-nos que tantas crianças, mulheres e homens precisam da nossa ajuda», congratulou Filomena Pinheiro, vice-presidente da Autarquia da Mealhada, elogiando «o olhar atento destes voluntários» e apelando «para que todos unam esforços tornando o nosso concelho um modelo nesta ambição da Gongô».

A quota anual da associação humanitária é de doze euros e os interessados em mais informações devem fazê-lo através de geral.gongo@gmail.com.

 

Mónica Sofia Lopes